NOSFERATU, de Joe Hill

Edição de 2014 da Editora Arqueiro

Há… no Colorado, nos Estados Unidos,
... Um velho que entra em seus sonhos e te leva ao encontro da morte, em seu Rolls-Royce;
... Uma menina com o Dom de encontrar o que está perdido, cruzando um Atalho de madeira torta e apodrecida;
... Crianças sendo levadas à Terra do Natal e nunca mais voltando...

E o dia em que a Menina e o Velho se encontram!



Nosferatu, terceiro romance de Joe Hill – o primeiro foi A Estrada da Noite(2007) seguido pel’O Pacto (2010); que teve seu título modificado em função do filme estrelado por Daniel Radcliffe, O Amaldiçoado, em 2013; apresenta muito do que seria influência de seu pai, o grande Stephen King, sem, contudo, perder elementos de originalidade. Joseph Hillstrom King constrói sua narrativa utilizando elementos e ganchos semelhantes aos utilizados pelo “King”, como a presença do sobrenatural que dispensa justificativa e explicação de sua real origem, como também uma personagem (em alguns casos a protagonista) travando uma luta, tanto contra aqueles que a consideram um estorvo e insignificante, quanto em reconhecer e lidar com seu Dom recém-descoberto.
Em Nosferatu somos apresentados à duas personagens distantes geograficamente. Primeiro conhecemos Victoria McQueen, no momento com 8 anos, pedalando bosque adentro em sua bicicleta nova e se distanciando de casa, à medida que o tom de discursão de seus pais aumenta por causa de uma pulseira perdida. Logo mais à frente, por magia ou não, ela avista uma ponte de madeira que antes não estava ali. A garota a cruza, enquanto em sua mente reverbera as palavras dos pais e a necessidade em reaver a pulseira para por fim à discursão. De modo inexplicável, do outro lado da ponte (ou do Atalho, como ela passa a  chama ao longo da narrativa conforme outras “viagens” acontecem) a menina se vê cruzando o estado inteiro, encontrando, enfim, a pulseira perdida: o autor nos entrega o primeiro gancho de sua história. A primeira peça do quebra cabeça.
Distante de Victoria, conhecemos Charlie Manx. Senhor de idade indecifrável, o vemos dirigindo o seu carro, modelo Rolls-Royce com a placa NOSFERATU (Aqui temos um jogo de palavras que a tradução tentou captar de modo fonético do título original em inglês: NOS4A2), nome do famoso vampiro alemão que termina por revelar muito sobre o comportamento de Charlie. Assim como Vic, Manx também tem o seu Dom: atrair criancinhas para um lugar dentro de sua mente denominado Terra do Natal, onde elas viverão “felizes para sempre”, enquanto seus corpos perdem a cor e seus dentes se rilham como cerrotes afiados. Com isso, Manx sobrevive anos a fio: extraindo a força vital dos pequenos, até que estes simplesmente estejam ocos como potes de barro vazios.
À medida que a história das duas personagens caminha, os jornais do país relatam o desaparecimento sem explicação de diversas crianças. Vic, já adolescente, decide ela mesma, utilizando o seu “dom de busca”, e enfrentar o sequestrador.
Eis que Vic encontra o cruel e doentio Charlie Manx.
Em meio aos eventos que resultam deste encontro (uma casa em chamas, outra criança levada e um cruel assassinato envolvendo a péssima combinação gasolina + fogo), Victoria foge, em parte ferida, em parte assustada, mas viva. Porém, Manx promete buscar, encontrar e se vingar daquela com um dom tão maravilhoso que ousou cruzar seu caminho e que conseguiu escapar por entre seus dedos.
Comparando a construção deste com o de seus dois livros anteriores, senti a intensa necessidade de Hill em mostrar do que é capaz. Ser filho de Stephen King deve pesar bastando quando acabam por comparar sua criação com a de seu pai. Pior ainda quando, os que se dizem “conhecedores”, julgam-na inferior. No entanto, quando o lemos desligados deste interesse desnecessário de comparação, encontramos um ótimo romance.
Nosferatu é denso quanto ao material de pesquisa. Vemos o deslocar da visão do narrador por entre os estados do país e percebemos o qual seguro ele está em descrever e apontar aspectos geográficos e de comportamento norte-americano. Algo que achei interessante foi o título dos capítulos: sempre o nome da cidade ou o local onde a personagem focada está. Isso isentou o narrador de realizar a constante descrição do espaço quando intercalava sua narração entre a vida de Vic e o que Manx estava aprontando.
Comparando esta narrativa à dos seus livros anteriores, penso ser este uma melhoria dos daqueles, tanto em nível de escrita (elaboração de enredo; linha de estilo narratológico etc) quanto de originalidade. Em relação a’O Pacto (Horns no título em inglês), nesse, Hill buscou trabalhar mais a fundo a complexidade da mente de suas personagens. Mesmo O Pacto se tratando de uma narração em primeira pessoa, senti a mente e o comportamento das personagens mais realista em Nosferatu. Já em A Estrada da Noite (Heart-Shaped Box), senti uma maior preocupação em “contar a história” do que elaborá-la antes, mas penso ser este fator comum quando se trata de um primeiro livro. O coração acelera mais à medida que vemos transcrito no papel aquela nossa ideia inicial.
Quanto ao desenrolar da narrativa, em alguns momentos o texto dá aquela parada, fazendo-nos ter a sensação de que “pronto! Agora que não termino mais este livro!”, mas são momentos escassos. Em dado momento você pensa que descobriu tudo do que Manx é capaz. Então Hill te surpreende e te deixa em choque uma vez mais: aí a história corre. Quando uma terceira pessoal, tão mais louca e doentia quanto Manx, entra na jogada, você só tem vontade de gritar para que Vic corra! Para que corra o mais longe possível e se esconda! Mas já conhecemos Manx e sabemos que não existe esconderijo algum que possa escondê-la dos olhos vidrados d’O Velho.
Mas o que o carro que Manx dirige trás de relevante ao enredo? Durante a narrativa, senti aquela forte presença de Stephen King sobre o carro. Isso porque o Rolls-Royce dirigido por Charlie Marx parece, de algum modo, ligado ao seu condutor. Em diversas passagens o carro parece ganhar vida, funcionando também como um tipo de catalizador de energia extraída das crianças enquanto Manx as conduz, cruzando as estradas dos EUA, em direção à “terra prometida”. Lembrei-me da lustrosa Christine, o carro assassino criado por King em Christine (1983). 
A pergunta final, porém, permanece: Joe Hill merece o título de “filho do Rei”?
Penso que o universo criando por Joe Hill pode muito bem habitar as prateleiras ao lado dos romances de Stephen King, onde Nosferatu não fica atrás de livros como Misery (1987) ou Doutor Sono (2013). Este livro é um daqueles do qual você não recomenda para qualquer um como sendo um livro bom, não por não considera-lo “recomendável”, mas por sentir que este merece a leitura por que tem olhos atentos e sede de virar a próxima página, sem medo de descobrir o qual ousado foi o seu autor em te surpreender.

Os dois primeiros romances de Joe Hill:
2007



2010
2014
Nova edição de capa de O Pacto


Luvanor N. Alves
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About luvanornalves

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2 comentários:

  1. A sua resenha está perfeita. Confesso que morri de inveja, rs...
    Parabéns. Vou continuar acompanhando o blog!!!

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  2. Como é bom ver a tua escrita, nos leva muito mais além do que possa ser. A resenha ficou ótima, e claro que vou continuar ligado no blog, no que precisarem de mim estou disponível. ^^ Um forte abraço aos dois e desejo muito sucesso!

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